Policial

Boa noite, Cinderela, droga que leva à inconsciência pode até matar vítimas em golpes

O termo é o nome do golpe praticado no qual a vítima é dopada com alguma droga misturada na bebida



Geralmente, criminosos misturam droga na bebida de vítimas (Ilustrativa, Freepik)



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‘Boa noite, Cinderela' é um golpe antigo que consiste em fazer as vítimas entrarem em um estado de inconsciência e, posteriormente, em perda da memória. O nome da prática considera a princesa da fábula que perde o sapatinho de cristal ao sair do baile. Sugestivo, pois as vítimas costumam perder itens valiosos ao ter a bebida batizada em baladas ou bares.

O termo é o nome do golpe praticado no qual a vítima é dopada com alguma droga misturada na bebida. As drogas utilizadas podem ser variadas, mas causam sempre efeito semelhante: depressão rápida do sistema nervoso central, com diminuição da capacidade de raciocínio, dos reflexos, perda da consciência, seguido de sono profundo, em geral, com amnésia anterógrada, o esquecimento de fatos recentes a partir da tomada do medicamento, segundo o assessor técnico do CRF/MS (Conselho Regional de Farmácia de Mato Grosso do Sul), Ronaldo de Jesus Costa. 

“Todos eles retardam ou tornam mais difícil a transmissão do impulso nervoso. Então, a pessoa tem a capacidade de raciocínio reduzida. Dependendo da droga, pode ocorrer sonolência em minutos ou em segundos. Contudo, a vítima pode permanecer acordada, em estado de narcolepsia e não se lembrar do que ocorreu após a ingestão da droga”.

O que utilizam?
Basicamente, os criminosos utilizam medicamentos para insônia, pré-anestésicos e alguns solventes químicos. Ronaldo reforça que as drogas que deprimem o sistema nervoso central representam risco de óbito, dependendo da dose. No caso específico, em geral, não são doses tão altas – apenas o suficiente para o efeito desejado.

“Porém, como estão sempre associadas à bebida alcoólica, o álcool pode potencializar o efeito e causar queda de pressão arterial, suficiente para levar ao óbito. Ainda mais se a vítima faz uso de algum outro medicamento tarja preta, que também deprime o sistema nervoso. Há, também, o risco de acidentes e quedas, que podem, sim, causar o óbito”. 

Cuidados com a saúde após o golpe
O medicamento é inserido na bebida alcoólica – este é o principal método, já que a bebida disfarça o efeito do entorpecente. Além disso, o álcool potencializa o efeito depressor no sistema nervoso.

Geralmente, a vítima não sabe que teve contato. Assim, se acordar em um lugar estranho, sem se lembrar do ocorrido antes de dormir, a procura por atendimento médico é fundamental.

Droga no organismo por 24h
O exame para detecção de substâncias psicoativas é feito através da urina. Segundo o médico, nutrólogo e toxicologista Sandro Benites, a droga permanece no organismo por 24 horas e o exame consegue detectar a utilização em até 48 horas na urina.

“Alguns dos medicamentos não têm sabor, como os antialérgicos, por exemplo, que causam sonolência profunda, afetando o sistema nervoso. Diante disso, a combinação com a bebida pode potencializar o efeito. A bebida alcoólica já é um depressor do sistema nervoso central e, dependendo da dose, pode levar a pessoa ao coma e até mesmo a uma parada cardíaca”.

Ainda de acordo com o especialista, há uma dificuldade para a vítima perceber que foi dopada, pois, caso a pessoa tenha o hábito de beber com frequência, pode acreditar que seria apenas um efeito do álcool.

“Muitas vezes, a pessoa não percebe, continua conversando, e só então começa a sentir o sono chegar. A medicação pode começar a fazer efeito entre 30 minutos a duas horas”.

Homem perdeu R$ 21 mil em golpe
No dia 4 de abril, um homem de 55 anos, foi roubado por duas mulheres em uma feira agropecuária de Campo Grande. A quadrilha utilizou o “boa noite, Cinderela” para dopar a vítima e levar R$ 21 mil. Dois já foram presos pelo crime.

Delegado da Polícia Civil, Rodrigo Camapum explica que há dois tipos frequentes de padrão em Mato Grosso do Sul: dopagem de vítimas em locais de aglomeração e encontros “amorosos”.

“No primeiro caso, o mais comum é quando a pessoa está em festas, baladas ou eventos similares e perde a atenção ao seu copo de bebida alcoólica, ou quando alguém oferece. A vítima tem sua consciência diminuída e sua capacidade de resistência reduzida. No segundo caso, a vítima acaba convidando um desconhecido para dentro de casa, geralmente conhecido por meio de aplicativos, seja homem ou mulher. Ao acordar, percebe que sofreu um crime patrimonial. Nesse contexto, o criminoso ou criminosa usa da sedução para ganhar a confiança da vítima e impedir sua defesa”.

O golpe do “boa noite, Cinderela” geralmente está associado a outros crimes consecutivos, como roubo, furto e até abuso sexual. Entretanto, a ação de dopar uma pessoa com a intenção de prejudicá-la é classificada como violência imprópria, quando o infrator, por qualquer meio, diminui a capacidade de resistência da vítima.

“É chamado de violência imprópria porque o roubo e o furto são cometidos mediante violência, mas nesse caso a vítima não tem resistência para evitar devido à dopagem. O golpe é um elemento no crime penal subsequente, como o furto e o roubo”.

Vergonha em denunciar
Dados da Sejusp (Secretaria de Justiça e Segurança Pública) indicam que em 2023, Mato Grosso do Sul registrou quatro boletins de ocorrências onde consta a dinâmica popularmente conhecida “boa noite, Cinderela”, sendo um roubo e dois furtos em Campo Grande e um furto em Caarapó.

O delegado enfatiza que, geralmente, os homens são os principais alvos do golpe e muitos têm vergonha de denunciar devido ao preconceito.

“Normalmente, esse crime é praticado para obter o patrimônio da vítima, subtraindo bens. No caso do homem, ele se sente constrangido em relatar que levou alguém para casa e acordou sem saber de nada, apenas com flashbacks, lembrando-se apenas de ter bebido algo. Hoje em dia, todos nós temos a vida no celular, com aplicativos liberados. O criminoso, ao conseguir deixar a vítima vulnerável, usa as ferramentas de segurança, como o acesso biométrico ou reconhecimento facial. Desta forma, realiza transferências bancárias e compras com os dados da vítima”.

Tome cuidado
Ao sair, cuide do seu copo: criminosos misturam a substância com a bebida alcoólica para potencializar a dormência da vítima. Portanto, em locais de aglomeração, fique atento à sua bebida;
Não aceite bebida de estranhos: apesar de ser um conselho antigo, evitar aceitar bebida de desconhecidos é um método de segurança nesses casos;
Permaneça perto de conhecidos: geralmente, o golpe é praticado por desconhecidos. Portanto, permanecer próximo de amigos, familiares e pessoas de confiança auxilia em situações de vulnerabilidade;
Procure segurança ou funcionários: Se sentir fraqueza repentina, sonolência súbita “do nada”, o delegado recomenda procurar a segurança ou funcionários do local para obter assistência médica;
Notou algo estranho? Avise a segurança ou a possível vítima: se perceber que alguém tentou adulterar a bebida de outra pessoa, alerte o indivíduo ou algum funcionário do evento.
Procure a polícia
Apesar da dificuldade da vítima se lembrar do que aconteceu após ser dopada, denunciar o crime é essencial. Segundo o delegado, o crime exige que a vítima fique inconsciente durante a prática, mas detalhes antes e após a perda de consciência facilitam a identificação dos envolvidos.

“Existem câmeras de segurança, em casas noturnas ou em ruas próximas de onde a vítima estava, que podem identificar o autor. Nem sempre se trata de uma quadrilha; às vezes, é apenas uma pessoa agindo”.