Política e Transparência

Sérgio Cruz entrou para a história do Estado, mas ficou fora da foto

Ele chegou atrasado no dia da posse da Assembleia Constituinte



Sérgio Cruz conta por que ficou de fora da foto histórica; ele também diz que brigas de grupos políticos prejudicaram o Estado e que a política não muda - Foto: Giuliano Lopes



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Destemido em seus pronunciamentos contra o regime militar, conhecido politicamente por ser um dos mais legítimos representantes da oposição nos chamados anos de chumbo e famoso por seu bordão “pau na mula”, o ex-deputado estadual Sérgio Manoel da Cruz – um dos 18 parlamentares responsáveis pela elaboração da primeira Constituição de Mato Grosso do Sul, em 1979 – faz parte da história, mas “não está” oficialmente nela. Na posse dos primeiros deputados, no dia 1º de janeiro de 1979, em solenidade na hoje Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), ele esteve ausente e, obviamente, não apareceu na foto oficial.

 Sérgio Cruz chegou atrasado e foto já tinha sido tirada

“Na verdade, saí para chegar na hora e cheguei um pouco depois da hora”, conta ao Correio do Estado. Em consequência disso, também não foi nem citado no livro que publicou a foto – anos depois – sobre a Constituinte e no qual constam apenas os nomes de 17 parlamentares. “Eu fiquei excluído da história, né?”, diz. Sérgio conta que no dia da posse, quando se dirigia para a cerimônia, houve um acidente de trânsito no trajeto. “Ficou muito tumultuado para chegar à universidade onde aconteceu a posse do governador e dos deputados. Atrasei. Quando cheguei, já havia sido tirada a fotografia. Então, o único deputado dos 18 constituintes que não apareceu na fotografia foi eu”.

Sobre o livro, Sérgio Cruz afirma que é a história de Mato Grosso do Sul, de autoria do professor Hildebrand Campestrini. O ex-parlamentar diz que, na realidade, “ninguém contou a história da Constituinte”. Segundo ele, na obra “aparece a fotografia com os 17 deputados e não tinha a história da Constituinte. A única referência que tinha era a fotografia. Nela, aparecem os nomes dos 17 deputados e não aparece o meu nome. É interessante destacar que a edição do livro foi patrocinada pela Assembleia Legislativa; não observou isso. Quer dizer, a Assembleia teria de ter exigido do autor do livro pelo menos um capítulo dedicado à Constituinte. Não tem a história. Então, foi a nota destoante e eu reclamo até hoje”. 

Sérgio Cruz conta que a divisão do Estado ocorreu no dia 11 de outubro de 1977 e ele, nessa época, era  deputado estadual ainda em Mato Grosso uno. No ano seguinte, quando terminava seu mandato, houve eleição em Cuiabá e ele disputou novamente, fazendo dobradinha com Walter Pereira (cujo último mandato foi de senador, com a morte de Ramez Tebet, do qual era primeiro-suplente). No dia 1º de janeiro de 1979, quando da instalação de Mato Grosso do Sul, tomaram posse o governador nomeado Harry Amorim Costa e os parlamentares da Assembleia Constituinte que elaboraram a Carta Magna, promulgada no dia 13 de junho do mesmo ano.

Diferente

Jornalista e radialista, Sérgio Cruz – que deixou a disputa de mandatos em 1982 – ainda hoje é lembrado por sua célebre frase como político: “pau na mula!”. Muitas vezes, inclusive, esse bordão é  utilizado em substituição ao seu nome de batismo, principalmente por alguns dos seus antigos correligionários, como prefeitos, vereadores e outras lideranças. Vale ressaltar que Sérgio também teve passagem pela Câmara dos Deputados e tinha base eleitoral em vários municípios. “Essa história de pau na mula foi o seguinte: eu apresentava um programa de cinco minutos por dia na Rádio Cultura e, na despedida, eu fazia pequena crônica e no encerramento fazia a despedida dizendo: Fé em Deus e pau na mula!”. Com a entrada na política, segundo ele, acabou ficando só o “pau na mula”.

Outra diferença de Sérgio Cruz político eram os comícios-relâmpagos que fazia na área central e alguns bairros de Campo Grande. Conta a lenda que ele discursava tendo como tribuna um caixote. Ele explica: “Não era um caixote. Era uma tribuninha, um palanquinho que a gente montou, aliás, com o Walter [Pereira]. A gente ia para as esquinas... Era um palanque portátil, um comício improvisado. Chegava na hora permitida, que era depois do meio-dia, e ficava nas esquinas. Fazia dois, três comícios-relâmpagos por dia. A gente abordava temas da época da campanha eleitoral. Fora da campanha, era a luta contra a ditadura. Tinha essa divisão: na época da campanha eleitoral, a gente fazia discurso contra a ditadura e a favor da nossa eleição, da mudança por meio da eleição; fora da campanha, eu fazia constantemente, não tinha data certa. Eu, estando em Campo Grande, subia na tribuninha e mandava ver”.

Ex-parlamentar afirma que a política não muda

Na sede da Assembleia Legislativa, Sérgio Cruz tem sua presença política registrada. Na placa com os nomes dos constituintes, ele está como um dos 18 parlamentares; também consta na galeria de ex-deputados e, recentemente, recebeu homenagens da Casa pelos 40 anos da primeira Constituição. Sobre o que mudou na política, ele é enfático: “Desde a Proclamação da República, é sempre a mesma coisa. O que muda são esses espaços, mudança de regime, período revolucionário. O político é sempre o mesmo. Tem o político da oposição, tem o político da situação. Quem está na oposição acha que está ruim, quem está na situação acha que está tudo bem”.

“Briga de grupos políticos prejudicou MS”

O ex-deputado Sérgio Cruz também falou desses 40 anos de instalação de Mato Grosso do Sul. Segundo ele, o norte (Mato Grosso) se uniu pelos seus interesses, e o sul (Mato Grosso do Sul) “herdou exatamente a política, as divisões políticas. Tinha o Canale (Antonio Mendes Canale). Aqui, ficou a divisão UDN e PSD. O Pedrossian tentando assumir todo o poder do Estado, sem conseguir. Tentou... Conseguiu depois, com a saída de Geisel (general Ernesto Geisel, presidente que criou o novo estado). O Figueiredo (presidente general João Figueiredo) entrou e deu uma mudada na política. Analisando hoje, 40 anos depois – eu que fui oposição do governo todo o tempo –, minha conclusão é de que se tivesse permanecido o Harry Amorim Costa (primeiro governador), não tivesse caído do Governo e tivesse dado continuidade aos projetos dele seria bem melhor para o Estado. Porque ele tinha um projeto de desenvolvimento moderno, enxuto. Agora, a grande briga política terminou prejudicando o Estado: primeiro, o dinheiro que era para ter vindo para Mato Grosso do Sul não veio; o dinheiro previsto na Lei Complementar foi para Cuiabá. Mato Grosso pegou o Estado sem dúvida nenhuma. A União assumiu todas as dívidas para poder dividir, foi exigência dos cuiabanos. Aliás, os cuiabanos fizeram duas exigências: uma era que Mato Grosso do Sul fosse Mato Grosso do Sul, e não outro nome, e Mato Grosso ficasse sem ser norte, e a outra [exigência] era que todas as dívidas fossem quitadas. Como houve a briga, se brigou muito aqui, o que Cuiabá fez? Enquanto brigávamos, eles foram pegando a grana, fazendo aquele chororô, tipo ‘a gente é pobrezinho, não tem nada’, tanto que Mato Grosso do Sul terminou se endividando e Mato Grosso não. Nós ficamos com uma dívida em determinada ocasião, Mato Grosso do Sul era o estado que mais devia para fora porque ficou sem o dinheiro da divisão”.