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Entrevista: Pesquisadora mexicana fala sobre Feminicídio

A partir de suas pesquisas sobre os crimes de Ciudad Juárez, no México, ela construiu uma tipologia para os feminicídios



Foto: Divulgação/TJ-MS



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Responsável pelo painel de abertura do I Fórum Internacional sobre Violência contra a Mulher, a professora pesquisadora mexicana Julia Monárrez falou  sobre Feminicídio na manhã desta quinta-feira (3) aos cerca de 180 participantes do evento. A partir de suas pesquisas sobre os crimes de Ciudad Juárez, no México, ela construiu uma tipologia para os feminicídios, tentando indicar os distintos contextos no qual as mulheres são assassinadas.

Confira a entrevista concedida pela professora à Secretaria de Comunicação do TJMS.

SCom – Professora, qual seria a definição de Feminicídio?

JM – É o assassinato, o homicídio de mulheres por razões de gênero e estas são muito simples, são as discriminações que fazem das mulheres os homens violentos que as assassinam: podem ser a misoginia, o controle da mulher, pode ser uma infinidade de questões, mas o feminicídio não é a expressão individual desses homens violentos. Essa violência permite a estrutura de gênero, é a socialização que se dá para a subordinação das mulheres e a superioridade dos homens.

SCom – Como começou seu estudo sobre este tema?

JM – O tema começou para mim em Ciudad Juárez. Expliquei hoje em minha apresentação sobre as tipologias que construí, então a palavra “feminicídio” como tal já existia tanto em inglês, com o termo femicide e em espanhol como femicidio e feminicidio. Eu optei pela palavra “feminicídio” por suas origens etimológicas, por isso escolhi a palavra “feminicídio” e construí várias categorias que são de minha autoria, como o feminicídio de mulheres em prostituição que são assassinadas e muito raramente alcançam justiça, porque se diz que são mulheres públicas, mulheres contaminadas, logo mereceriam a morte que lhe são dadas. E também o “feminicídio sexual sistêmico”, que é uma tipologia criada que desenvolvi especialmente para Ciudad Juárez e que a dividi em duas categorias: “feminicídio sexual sistêmico organizado” e “feminicídio sexual sistêmico desorganizado”.

SCom – Quais são as semelhanças e diferenças entre as situações de feminicídio que ocorrem no Brasil e no México?

JM – Eu não acredito que sejam tão diferentes, independentemente que eu não conheça a situação que prevalece no Brasil. No entanto, no Brasil as estatísticas, dadas pela Comissão Econômica da América Latina, é que a cada 10 mortes violentas de mulheres que moram na América Latina, 4 são no Brasil. E a América Latina e o Caribe concentram o maior número de mortes violentas, tanto de homens quanto de mulheres. Então, no Brasil, é uma situação preocupante e uma situação que não deveria ser permitida.

SCom – Você acredita que a impunidade é uma das principais causas do Feminicídio?

JM – Sim, há uma impunidade tremenda. De acordo com o estudo mundial sobre homicídios feito pela Organização das Nações Unidas, a América Latina é onde há maior impunidade, que a justiça não se aplica; tem-se um déficit na aplicação da justiça.

SCom – É mais barato prevenir do que reparar o dano às mulheres?

JM – Completamente de acordo, porém antes disso quero dizer que quando me diz que a impunidade é um dos fatores que faz com que as mulheres continuem sendo assassinadas, ressalto  que também existem as questões de estrutura econômica, porque a maioria das que são assassinadas na América Latina são as mulheres em pobreza. Isso não quer dizer que as mulheres de classe média ou que tem melhores condições econômicas não seja assassinadas, mas a grande maioria são as meninas e mulheres em pobreza. Então, existe uma grande desigualdade em ser mulher, em ser pobre, em ser uma mulher marginalizada, não é o mesmo que ser uma mulher branca, uma mulher mestiça, uma mulher indígena, uma mulher negra; todas estas categorias têm a ver com a construção da pele como uma construção discriminatória que incida também para que mulheres e meninas sejam assassinadas e para que não haja justiça.

SCom – Então você acredita que é uma questão também de falta de políticas públicas?

JM – Creio que a vontade política não está em prevenir a violência, em aplicar a justiça, pois esta passa uma mensagem de pedagogia, que as pessoas não podem se apoderar, que os homens não podem se apoderar da vida das mulheres, pois quando é passada essa mensagem por meio da justiça, diminuem-se os índices da violência, e, ademais, deve se assegurar que as mulheres estejam em espaços seguros.

O estudo mundial de 2019 sobre homicídios da Organização das Nações Unidas diz que 63% dos homicídios cometidos no mundo são resolvidos pela polícia. No entanto, essa porcentagem cai para 43% na América Latina, devido à impunidade causada por um sistema policial fraco, e aqui se fala de todos os homicídios, contra homens e mulheres.

SCom – Qual a importância de um evento como este para debater a questão da violência contra a mulher?

JM – É muito importante, porque é um tema que está na agenda política das mulheres latinoamericanas e o Brasil, como integrante da América Latina, tem parte nessa violência.

Perfil – Doutora em Ciências Sociais pela UAM-Unidad Xochimilco, com especialização em Mulher e Relações de Gênero, Julia Estela Monárrez Fragoso é professora pesquisadora de El Colegio de la Frontera Norte, anexo ao Departamento de Estudios Culturales en la Dirección Regional Noroeste, Ciudad Juárez, no México.

 

Fonte: Assessoria/TJ-MS